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Ação de conhecimento, dano moral, juízo, recuperação judicial – STJ

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Ação de conhecimento, dano moral, juízo, recuperação judicial – STJ

STJ. Tratando-se de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial

 

 

No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento,
submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso.

A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto.

Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do §1º do art. 6º da Lei n. 11.101/2005.

Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial.

Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora.

Íntegra do acordão:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL
ADVOGADOS : CLÁUDIA REGINA SOARES E OUTRO(S)
LUCIMARA FERRO MELHADO E OUTRO(S)
RECORRIDO : WILLIAM ROBERTO DE CAMPOS
ADVOGADO : ANA CAROLINA DE MORAIS GUERRA E OUTRO(S)

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISCUSSÃO SOBRE INCLUSÃO DE CRÉDITO EM PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. “DEMANDA ILÍQUIDA”. APLICAÇÃO DO § 1º DO ART. 6º DA LEI N. 11.101⁄2005. CRÉDITO REFERENTE À AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBRIGAÇÃO EXISTENTE ANTES DO PEDIDO DE SOERGUIMENTO. INCLUSÃO NO PLANO DE RECUPERAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄2005. RECURSO PROVIDO.

1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha a examinar uma a uma as alegações e os argumentos expendidos pelas partes. Ademais, não se configura omissão quando o julgador adota fundamento diverso daquele invocado nas razões recursais.

2. No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso.

3. A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto.

4. Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do § 1º do art. 6º da Lei n. 11.101⁄2005.

5. Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101⁄2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

6. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial.

7. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora.

8. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente) e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi.

Brasília (DF), 07 de abril de 2016(Data do Julgamento)

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0)
RECORRENTE : GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL
ADVOGADOS : CLÁUDIA REGINA SOARES E OUTRO(S)
LUCIMARA FERRO MELHADO E OUTRO(S)
RECORRIDO : WILLIAM ROBERTO DE CAMPOS
ADVOGADO : ANA CAROLINA DE MORAIS GUERRA E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Grupo de Comunicação Três S.A. contra decisão proferida pelo Juízo de primeiro grau, que afastou a submissão do crédito executado – sentença condenatória proferida em autos de ação indenizatória – aos efeitos da recuperação judicial, bem como determinou a intimação da recorrente, na pessoa do advogado, a proceder ao pagamento espontâneo da obrigação, sob pena de multa de 10% (dez por cento), nos termos do art. 475-J do antigo Código de Processo Civil.

Ao analisar a controvérsia, o Tribunal de origem negou provimento ao recurso, conforme ementa abaixo transcrita:

INDENIZAÇÃO – Incidência dos efeitos da recuperação judicial – Não aplicação do art. 49, da Lei nº 11.101⁄2005 – Constituição do crédito que se deu com a prolação do Acórdão que, inclusive, majorou o quantum indenizatório – Pedido de recuperação judicial que antecedeu a formação do título executivo.
EXECUÇÃO PROVISÓRIA – Intimação para pagamento espontâneo, sob pena da multa de dez por cento sobre o montante da condenação – Possibilidade – Aplicação do art. 475-J, do Código de Processo Civil – Dispositivo que visa compelir o executado a, prontamente, adimplir suas obrigações, desestimulando as usuais protelações – Termo inicial do prazo para cumprimento – Intimação na pessoa do advogado, via publicação na imprensa oficial Hipótese verificada no presente caso. Ademais, nos termos da legislação processual civil, os recursos extraordinário e especial não impedem a execução da sentença (art. 497) – Decisão mantida – AGRAVO NÃO PROVIDO.

Opostos embargos de declaração (fls. 382-383), foram rejeitados (fls. 386-391).

Irresignado, Grupo de Comunicação Três S.A. interpõe recurso especial, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional (fls. 399-426), no qual se alega violação ao disposto nos arts. 47, 49, 51, IX, e 52 da Lei n. 11.101⁄2005 e 398 do Código Civil de 2002. Acena, ainda, pela existência de dissídio jurisprudencial.

Inicialmente, destaca que, em 17⁄6⁄2002, a recorrida ingressou com ação indenizatória em face da ora recorrente, objetivando o ressarcimento moral decorrente da veiculação de matéria jornalística publicada na Revista Istoé de 22⁄5⁄2002.

Diz que a sentença, proferida em 19⁄5⁄2008, julgou procedente o pedido para condenar a ré ao pagamento de indenização no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), cujo valor foi majorado para R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) após o julgamento do recurso de apelação, realizado em 29⁄7⁄2008.

Informa que, após a rejeição dos embargos de declaração e a inadmissão dos recursos especial e extraordinário, o recorrido deu início à execução provisória, o qual, segundo o juízo cível, não se submete aos efeitos da recuperação judicial em curso.

Feito um breve resumo da demanda, a parte recorrente sustenta a nulidade do acórdão recorrido, pois, não obstante a oposição de embargos de declaração, os vícios apontados não foram sanados.

No mérito, assevera que o entendimento do Tribunal a quo é equivocado e extremamente gravoso, uma vez que permite o pagamento de credor fora dos autos da recuperação judicial, criando, assim, privilégio em relação aos demais.

Alega que “o caso dos autos versa sobre obrigação constituída com o fato danoso, resultando na condenação da Recorrente na obrigação de pagar ao Recorrido a indenização por danos morais sofridos lá no ano de 2002” e, “por mais que a sentença tenha reconhecido esse dever após a data do pedido de Recuperação Judicial, a obrigação restou contraída com a conduta do Recorrente em ofender o Recorrido” (fl. 416).

Pondera que a própria Lei n. 11.101⁄2005 determina que o requerimento de recuperação judicial deve conter a relação de todas as ações existentes naquela data, com a indicação de suas estimativas, sob pena de indeferimento do pedido (arts. 51, X e 52).

Explicita, ainda, que é facultado ao credor efetuar o pedido de reserva da importância estimada referente ao crédito a ser inscrito no plano de recuperação.

Argumenta que “a partir da circulação da reportagem considerada ofensiva, o Recorrido passou a ser titular de um direito⁄crédito que o legitimou com o ingresso da ação em 17⁄06⁄2012, sendo, pela sentença condenatória, independente da data desta, apenas certificada a existência da ofensa e aplicada as sanções jurídicas que decorreram da norma, não da sentença” (fl. 417).

Aduz que a sentença condenatória é constitutiva da sanção ou do estado de sujeição aos atos de execução, tendo em vista que a sua executividade decorre da circunstância de se tratar de uma norma jurídica individualizada.

Defende que “pela interpretação sistemática da norma, a data da sentença – que quantificou o direito⁄crédito do Recorrido e lhe facultou a execução – é irrelevante, pois o ato que constituiu o crédito é anterior à Recuperação, assim como a data da propositura da ação indenizatória idem, e estes sim, já existiam ao tempo do pedido” (fls. 419-420).

Contrarrazões ao recurso especial às fls. 444-449.

Crivo positivo de admissibilidade na origem (fls. 461-463).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL
ADVOGADOS : CLÁUDIA REGINA SOARES E OUTRO(S)
LUCIMARA FERRO MELHADO E OUTRO(S)
RECORRIDO : WILLIAM ROBERTO DE CAMPOS
ADVOGADO : ANA CAROLINA DE MORAIS GUERRA E OUTRO(S)
EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISCUSSÃO SOBRE INCLUSÃO DE CRÉDITO EM PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. “DEMANDA ILÍQUIDA”. APLICAÇÃO DO § 1º DO ART. 6º DA LEI N. 11.101⁄2005. CRÉDITO REFERENTE À AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBRIGAÇÃO EXISTENTE ANTES DO PEDIDO DE SOERGUIMENTO. INCLUSÃO NO PLANO DE RECUPERAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄2005. RECURSO PROVIDO.

1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha a examinar uma a uma as alegações e os argumentos expendidos pelas partes. Ademais, não se configura omissão quando o julgador adota fundamento diverso daquele invocado nas razões recursais.

2. No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso.

3. A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto.

4. Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do § 1º do art. 6º da Lei n. 11.101⁄2005.

5. Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101⁄2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

6. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial.

7. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora.

8. Recurso especial provido.

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. De início, verifica-se que não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o Eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha examinar uma a uma as alegações e os fundamentos expendidos pelas partes. Basta ao órgão julgador que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo exigível que se reporte, de modo específico, a determinados preceitos legais. Além disso, não significa omissão o fato de o julgador adotar outro fundamento que não aquele perquirido pela parte.

No caso dos autos, a tese jurídica sobre a possibilidade de submissão do crédito ao plano de recuperação judicial foi amplamente debatido no aresto impugnado, razão pela qual não procede o argumento sobre a existência de omissão a respeito da incidência dos arts. 6º, 47, 51, 52 e 59 da Lei n. 11.101⁄2005 (LFR).

Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: (1) AgRg no AREsp 704.658⁄RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 8⁄3⁄2016, DJe 14⁄3⁄2016; (2) AgRg no REsp 1564178⁄RN, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 8⁄3⁄2016, DJe 17⁄3⁄2016; (3) AgRg no AREsp 827.039⁄MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15⁄3⁄2016, DJe 17⁄3⁄2016; (4) AgRg no REsp 1300894⁄RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 10⁄3⁄2016, DJe 16⁄3⁄2016; (5) AgRg no REsp 961.709⁄RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 9⁄3⁄2010, DJe 23⁄3⁄2010.

3. Ultrapassada a preliminar, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso.

Na parte que interessa, o acórdão recorrido assim dispôs:

O recurso não merece acolhimento.
A ação indenizatória ajuizada por Willian Roberto de Campos foi julgada procedente para condenar Grupo de Comunicação Três S⁄A no pagamento de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), acrescidos de correção monetária pela tabela prática para cálculo de atualização monetária dos débitos judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo e de juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano, contados da data do evento danoso (22.5.2002), além de publicar no mesmo periódico, com chamada de primeira página, a íntegra da decisão r. de fls. 150⁄155 (processo nº 000.02.112499-0 22ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Capital proferida em 19.5.2005).
Por unanimidade, a Décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça⁄SP, negou provimento ao recurso da ré e deu parcial provimento ao recurso do autor para majorar a indenização, fixando-a em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), com incidência de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a partir da entrada em vigor do novo Código Civil v. acórdão de fls. 202⁄209 (apelação nº 436.698-4⁄3-00, julgada em 29.7.2008).
O pedido declaratório (fls. 212⁄215) foi rejeitado, por unanimidade V. Acórdão de fls. 217⁄220 (embargos de declaração nº 436.698-4⁄5-01, julgados em 9.12.2008).
Negado seguimento aos recursos especiais e extraordinário – r. decisões de fls. 271⁄272 e 273⁄274.
Pois bem.
Ao que se verifica, o plano de recuperação judicial do Grupo de Comunicação Três S⁄A foi aprovado em assembléia geral de credores realizada em 20 de maio de 2008 – fls. 241 (processo nº 100.07.152612-0 2ª Vara da Falência e Recuperações Judiciais).
Ocorre que, a constituição do crédito se deu com a prolação do Acórdão 29 de julho de 2008 – que, diante dos limites da ação tratada, cuidou de majorar o quantum indenizatório.
Por conseguinte, a regra prevista no caput do art. 49, da Lei nº 11.101⁄2005 não se enquadra à hipótese dos autos, já que o pedido de recuperação judicial antecedeu a formação do título executivo (Acórdão).

4. Nesse passo, a meu ver, a solução do caso exige a análise conjunta e sistemática de diversos dispositivos previstos na Lei n. 11.101⁄2005 (LFR).

Segundo o inciso III do art. 51 da LFR, a petição inicial do pedido de recuperação judicial deve ser instruída com a relação nominal dos credores, indicando-se a sua natureza e classificação, o valor atualizado do crédito e os regimes dos respectivos vencimentos.

Além disso, o requerimento deve conter “a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados” (art. 51, IX, da LFR).

Por sua vez, o art. 6º regula a suspensão de todas as ações em face do devedor em recuperação judicial ou em processo de falência, determinando o prosseguimento de todas aquelas que demandarem quantia ilíquida, in verbis:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.

Em outras palavras, a suspensão do curso de ações e execuções individuais não alcança as demandas que versarem sobre quantia ilíquida, ou seja, aquelas que dependem de prévia apuração para se definir o valor do crédito.

Mauro Rodrigues Penteado, em livro coordenado por Franscisco Satiro de Sousa Junior e Antônio Sérgio A. de Moraes Pitombo, explica a finalidade da norma:

É desnecessário reiterar o que já foi dito acerca da ratio essendi do ditado legal, em última análise voltado à economia processual e à natureza do juízo universal, que é procedimento de execução coletiva, na falência, ou de quantificação de valores líquidos que oneram o patrimônio do devedor, na recuperação judicial, a fim de que possa ser avaliada a viabilidade do respectivo plano, tendo em mira sua concessão. Lógica, portanto, a solução de manter as ações nos juízos de origem, até que sejam apurados os créditos devidos, para inclusão no Quadro-Geral de Credores.
(PENTEADO, Mauro Rodrigues. Comentários à lei de recuperação de empresas e falência – coord. por Franscisco Satiro de Sousa Junior e Antônio Sérgio A. De Moraes Pitombo. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 138). [original sem grifos]

Por isso que, em tais casos (§ 1º), a lei defere a possibilidade de o juízo determinar a reserva de importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência e, após reconhecido o direito e a sua liquidez, haverá a inclusão do crédito na classe própria, observando-se, assim, eventual ordem de privilégio (§ 1º do art. 6º).

Nesse sentido também é a lição da doutrina:

Tratando-se de título ilíquido, estamos diante de um direito ainda não totalmente adquirido. É o caso do trabalhador que, ao tempo da quebra da empresa, estava promovendo ação contra esta da Justiça do Trabalho. O processo falimentar segue seu curso normal, e pode haver venda de bens, com pagamento, inclusive de credores trabalhistas, enquanto sua causa trabalhista continua tramitando, ainda sem decisão, ou com recurso. Neste caso ele tem um crédito ilíquido, ainda não apurado por sentença. Isto é, não dispõe do título judicial. Assim, deverá o credor pedido a reserva de seu crédito no juízo trabalhista, para que ele determine, por ofício, a reserva no juízo da falência, na forma do § 3º do art. 6º. O mesmo se aplica às ações que tramitem em outros juízos, conforme o § 1º deste artigo. Apesar de os credores dessas ações não disporem do título judicial, nenhum prejuízo sofrerão se, tempestivamente, fizerem a reserva a que alude o § 3º retrocitado.
(ARAÚJO, José Francelino. Comentários à lei de falência e recuperação de empresas. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 34).

Observa-se, ademais, que a ação na qual se busca indenização por danos morais – caso do autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto.

Dessa forma, verifica-se que, durante o trâmite do processo de recuperação judicial, haverá o prosseguimento da ação na qual se busca indenização por dano moral. Após, sendo determinado o valor, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade devedora.

Com essa mesma linha de raciocínio, Sérgio Campinho explica que “as ações que demandarem quantia ilíquida não serão suspensas e prosseguirão, no juízo de seu processamento, até que as importâncias perseguidas se tornem líquidas, ocasião em que os respectivos créditos serão incluídos no quadro-geral de credores, nas classes que lhe forem próprias” (CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa. Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 150).

Em diversos julgados desta Corte Superior, especialmente em sede de conflito de competência, ficou assentada a necessidade de permanência da “demanda ilíquida” no juízo em que estiverem sendo processadas e, após a apuração do valor correspondente, submete-se aos efeitos da recuperação judicial, in verbis:

__________
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL (LEI N. 11.101⁄05). AÇÃO DE DESPEJO C⁄C COBRANÇA DE ALUGUÉIS. DEMANDA ILÍQUIDA. EXECUÇÃO. MONTANTE APURADO. HABILITAÇÃO DO CRÉDITO NO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
1. Não há óbice ao prosseguimento da ação de despejo promovida em desfavor de empresa em recuperação judicial por constituir demanda ilíquida não sujeita à competência do juízo universal.
2. Por mais que se pretenda privilegiar o princípio da preservação da empresa, não se pode afastar a garantia ao direito de propriedade em toda a sua plenitude daquele que, durante a vigência do contrato de locação, respeitou todas as condições e termos pactuados, obtendo, ao final, decisão judicial – transitada em julgado – que determinou, por falta de pagamento, o despejo do bem objeto da demanda.
3. O crédito referente à cobrança de aluguéis deve ser habilitado nos autos do processo de recuperação judicial.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no CC 133.612⁄AL, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14⁄10⁄2015, DJe 19⁄10⁄2015)
__________
CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. FALÊNCIA. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL POR INADIMPLEMENTO CUMULADA COM PEDIDO DE PERDAS E DANOS E MULTA. JUÍZOS CÍVEL COMUM E FALIMENTAR. DEMANDA RELATIVA À QUANTIA ILÍQUIDA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO EM QUE ESTIVER SENDO PROCESSADA A AÇÃO DE CONHECIMENTO.
1. O art. 24, § 2º, II, do Decreto-lei 7.661⁄45 foi revogado com o advento da Lei n. 11.101⁄2005 (art. 6º, § 1º), acarretando redução das hipóteses que não se submetem aos efeitos da falência⁄recuperação. Assim, as demandas relativas à quantias ilíquidas continuam tramitando no juízo em que estiverem sendo processadas.
2. No caso em comento, pretendem os autores da ação que tramita na 4ª Vara Cível de Curitiba o cancelamento do registro imobiliário em decorrência do alegado inadimplemento contratual, indenização por perdas e danos e pagamento de multa pelo inadimplemento (fls. 64⁄72), demanda movida em face da Encol S⁄A, compradora do imóvel em questão, a qual revendeu as unidades imobiliárias a terceiros.
3. Destarte, tratando-se de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir – a princípio até a sentença -, perante o juízo na qual foi proposta, não havendo falar em competência absoluta do Juízo Falimentar para apreciar e julgar a demanda, nos termos do artigo 6º, § 1º, da Lei n. 11.101⁄2005.
Precedentes.
4. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível de Curitiba⁄PR.
(CC 122.869⁄GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22⁄10⁄2014, DJe 02⁄12⁄2014)
__________
PROCESSO CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA, ENTRE O JUÍZO DA AÇÃO ORDINÁRIA DE CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (JUÍZO DE DIREITO DA VARA DO 1º OFÍCIO DE PORTO CALVO, ALAGOAS) E O JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL (JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DE RECIFE, PERNAMBUCO).
1. Nos termos do art. 100, IV, ‘d’, do Código de Processo Civil, a competência para processar e julgar a ação que exigir o cumprimento de obrigação contratual é do Juízo do lugar onde esta deve ser satisfeita. Precedentes jurisprudenciais.
2. A Lei nº 11.101⁄2005, no seu art. 6º, § 1º, afasta a competência do Juízo da Recuperação Judicial para as ações de conhecimento que demandem quantia ilíquida.
3. Antecipação de tutela pelo Juízo onde se processa a ação ordinária de cumprimento de obrigação de fazer, determinando o corte, carregamento, transporte e moagem de cana-de-açúcar, após o que deverá ser encaminhado ao Juízo da recuperação o resultado financeiro.
4. Procedência parcial do conflito.
5. Prejudicados os embargos de declaração.
(CC 108.975⁄PE, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS), SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24⁄11⁄2010, DJe 15⁄02⁄2011)
__________ [originais sem grifos]

A título de reforço argumentativo, a LFR exige que, além da verificação periódica em cartórios de distribuição, todas as ações propostas em face do devedor deverão sejam comunicadas ao juízo concursal, sendo tal incumbência do respectivo magistrado e do próprio devedor, quando do recebimento da petição inicial e da citação, respectivamente (art. 6º, I e II, da LFR).

A ideia, portanto, que se apreende do sistema legal da recuperação, é a necessidade de controle que o juízo deve ter sobre o trâmite de todas as ações ajuizadas contra o devedor e a ciência daquelas demandas propostas após a formulação do pedido de soerguimento.

Ora, se essas ações propostas antes do pedido de recuperação judicial – ainda que ilíquidas em momento anterior – não fossem contempladas no plano de recuperação, inexistiria razão para a lei determinar que o pedido de soerguimento apresentasse a relação de todas as demandas ajuizadas, com a explicitação da estimativa dos valores discutidos em juízo.

Acrescente-se, como já dito, a possibilidade de o juízo, onde estiverem sendo processadas as “ações ilíquidas”, determinar a reserva de valor para a satisfação da obrigação reconhecida judicialmente.

Como arremate, a própria lei determina que, após a apuração do valor devido nos autos da “ação ilíquida”, o crédito decorrente da sentença judicial será incluído na classe própria do quadro geral de credores. Não se quer, desse modo, que haja execuções paralelas, com o intuito de haver pagamento fora do plano aprovado pela Assembleia Geral de Credores.

Assim, diante de todos os dispositivos acima analisados e dos argumentos expendidos, penso que o crédito discutido nos autos, decorrente de demanda ilíquida proposta antes do deferimento da recuperação judicial, deve se submeter aos seus efeitos.

5. Convém esclarecer, é bem verdade, que o caput do at. 49 da LFR disciplina que somente os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, estarão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, in litteris:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

Infere-se do dispositivo acima transcrito que estão sujeitos à recuperação judicial e, portanto, aos seus efeitos, todos os créditos existentes até a data em que protocolizado o pedido de recuperação judicial. Em contrapartida, se a constituição do crédito for posterior, fica afastada a aplicação do regime concursal.

Fábio Ulhoa Coelho faz as seguintes considerações acerca da questão:

A recuperação atinge, como regra, todos os credores existentes ao tempo da impetração do benefício.
Os credores cujos créditos se constituírem depois de o devedor ter ingressado em juízo com o pedido de recuperação judicial estão absolutamente excluídos dos efeitos deste. Quer dizer, não poderão ter seus créditos alterados ou novados pelo Plano de Recuperação Judicial.
(COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falências e de recuperação de empresas. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 191). [original sem grifos]

Marcos Andrey de Sousa também não vacila ao afirmar que:

O primeiro aspecto a observar é o marco temporal, qual seja, a data do pedido. Os credores posteriores ao pedido não podem ser incluídos no plano de recuperação, mesmo que este seja elaborado e apresentado posteriormente.
(LUCCA, Nilton de; SOUZA, Marcos Andreys; SIMÃO FILHO, Adalberto. (coord). Comentários à nova lei de recuperação de empresas e de falências. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 228⁄229) [original sem grifos]

De fato, se analisada a questão também pelo ângulo da doutrina civilista, o resultado não pode ser outro.

É que, presente a responsabilidade civil extracontratual – caso do autos -, a obrigação de indenizar surge com a configuração do evento danoso. Por isso que o art. 927 do Código Civil de 2002 dispõe que a violação do direito, aliado ao dano, rende ensejo ao dever de reparar.

Percebe-se que a “violação do direito” e o “dever de reparar” são fatos jurídicos que surgem simultaneamente. Acerca da questão, Sérgio Cavalieri Filho destaca que “a responsabilidade civil opera a partir do ato ilícito, com o nascimento da obrigação de indenizar, que tem por finalidade tornar indemne o lesado, colocar a vítima na situação em que estaria sem a ocorrência do fato danoso” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2014, p. 16).

Por isso que Arnaldo Rizzardo ensina que “a prática de um ato ilícito determina o ressarcimento dos danos, o que se verifica com a reposição das coisas em seu estado anterior” (RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 53).

Nessa mesma linha de intelecção, Rui Stoco, de forma bem sintética, também ensina que “da prática do ato ilícito decorre a responsabilidade do agente” e, em seguida, diz que, a partir do ato gerador do dano, “nasce a obrigação de indenizar ou compensar” (STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 191).

Com idêntico enfoque, Flávio Tartuce pondera que “a responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar de observar um preceito que regula a vida (TARTUCE, Flávio. Direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2015, p. 319).

Desse modo, ao prejudicado pelo ato ilícito assiste o direito de exigir uma importância destinada a reequilibrar a sua posição jurídica, revelando o caráter pecuniário do ressarcimento decorrente da responsabilidade civil extracontratual.

Dessarte, com o ato ilícito surge o direito de crédito, cuja quantificação caberá às partes, em comum acordo, ou ao magistrado, por meio de ação indenizatória. Em outras palavras, se o fato (dano) ocorreu, fica postergado a outro momento apenas a mensuração da extensão do infortúnio causado à vítima.

A fixação do valor é protraído no tempo, mas o dever jurídico de indenizar nasce com o evento danoso.

Outrossim, não se olvide que, se houver resistência do agente responsável pelo dano, caberá a intervenção do Poder Judiciário, que declarará uma situação jurídica preexistente (ato gerador do dano) e o condenará ao pagamento da indenização, seja de ordem moral, material ou estética (extensão do dano). Nesse caso, é a partir da sentença que há o dimensionamento do valor, que se torna líquido.

Portanto, o crédito constituído depois de iniciado o processo de recuperação, mas decorrente de sentença ilíquida anterior, deve mesmo constar do plano.

É por tal razão, vale gizar novamente, que, durante o trâmite do processo de recuperação judicial, haverá o prosseguimento da ação na qual se busca indenização por dano moral. Após, sendo determinado o valor, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade devedora.

No caso em análise, observa-se que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, ocorreu antes do pedido de recuperação judicial. Por sua vez, a sentença que declarou a existência do dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação também foi proferida em momento anterior ao pedido de soerguimento.

Assim, a meu ver, o crédito já estava constituído antes do início do processo de recuperação judicial, razão pela qual deve ser habilitado no quadro geral de credores. Apenas o trânsito em julgado ocorreu posteriormente.

Essa linha de raciocínio está coerente com o acórdão proferido do AgRg no AREsp n. 153.820⁄SP, da Terceira Turma deste Tribunal, segundo o qual, no caso de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento do pedido de recuperação judicial, deve ocorrer sua inclusão e habilitação no quadro geral de credores da sociedade devedora, nos termos da ementa abaixo colacionada:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DE TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DO EXPEDIENTE FORENSE. RECESSO. VIOLAÇÃO DO ART. 170 DA CF⁄88. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. NÃO CABIMENTO. CONTRARIEDADE AOS ARTIGOS 47 E 49 DA LEI N. 11.101⁄05. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. CRÉDITO REFERENTE À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HABILITAÇÃO. CABIMENTO. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄05. NOVAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282⁄STF. INCIDÊNCIA.
1. A comprovação da tempestividade do agravo em recurso especial em decorrência de suspensão de expediente forense no Tribunal de origem pode ser feita posteriormente, em sede de agravo regimental, desde que por meio de documento idôneo capaz de evidenciar a prorrogação do prazo do recurso cujo conhecimento pelo STJ é pretendido.
2. Para comprovar a tempestividade do recurso, é necessário que o recorrente demonstre qual o período de recesso estabelecido pelo respectivo tribunal, pois, sem essa providência, a atividade jurisdicional é tida como ininterrupta, nos termos da Emenda Constitucional n. 45⁄2004.
3. Tempestividade do recurso especial comprovada.
4. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça intervir em matéria de competência do STF, sob pena de violar a rígida distribuição de competência recursal disposta na Lei Maior.
5. Na hipótese de existir crédito proveniente de responsabilidade civil por fato preexistente ao momento do deferimento da recuperação judicial, é necessária a habilitação e inclusão do crédito em questão no plano de recuperação da empresa correspondente.
6. Aplica-se o óbice previsto na Súmula n. 282⁄STF quando as questões suscitadas no recurso especial não tenham sido debatidas no acórdão recorrido nem, a respeito, tenham sido opostos embargos declaratórios.
7. Agravo regimental conhecido para, conhecendo do agravo em recurso especial, conhecer parcialmente do recurso especial e dar-lhe provimento.
(AgRg no AREsp 153.820⁄SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10⁄09⁄2013, DJe 16⁄09⁄2013) [original sem grifos]

É possível constatar, do precedente acima invocado, que o recurso envolve a mesma parte recorrente e apresenta suporte fático bem semelhante, inclusive com a existência de sentença condenatória quando da apresentação do pedido de soerguimento, in verbis:

II) Contrariedade aos arts. 47 da Lei n. 11.101⁄05 e divergência jurisprudencial
A irresignação da ora recorrente no que diz respeito ao pedido de inclusão do crédito ora constituído – montante indenizatório por dano moral – na sua recuperação judicial reúne condições de prosperar.
A ação indenizatória foi julgada procedente em 3.11.06, para condenar a recorrente ao pagamento de indenização por dano moral no valor de 400 salários mínimos. Posteriormente, esse montante foi reduzido para 200 salários mínimos em sede de apelação em 2.12.08. O pleito de recuperação judicial iniciou-se em 14 de maio de 2007, tendo sido deferido em 26 de junho de 2007. Portanto, tratando-se de crédito proveniente de responsabilidade civil por fato preexistente ao momento do deferimento da recuperação judicial, é necessária a habilitação e inclusão do crédito em questão no plano de recuperação da empresa ora recorrente. [original sem grifos]

Por fim, é válido consignar que essa discussão difere daquela travada nos autos do Conflito de Competência n. 129.720-SP, no qual fiquei vencido, oportunidade em que a Segunda Seção firmou o entendimento retratado na ementa abaixo colacionada:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – CRÉDITO TRABALHISTA CONSTITUÍDO APÓS O DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL – ATO EXPROPRIATÓRIO ORDENADO PELO MAGISTRADO LABORAL GENÉRICO E SEM QUALQUER RESSALVA – ANTE A ESPECIFICIDADE DO CASO, COMPETE AO JUÍZO UNIVERSAL AVALIAR ACERCA DA ESSENCIALIDADE OU NÃO DO BEM AO FUNCIONAMENTO DA EMPRESA – PRECEDENTES DO STJ.
1. Tratando-se de crédito trabalhista constituído depois de ter o devedor ingressado com o pedido de recuperação judicial, está excluído do plano e de seus efeitos (art. 49, caput, da Lei n.º 11.101⁄2005).
2. Ante a determinação de ato expropriatório genérico e sem ressalva determinado pelo magistrado trabalhista para a satisfação do crédito executado, compete ao juízo universal exercer o controle sobre atos de constrição patrimonial. Precedentes do STJ.
3. Conflito conhecido para declarar a competência do juízo da recuperação judicial.
(CC 129.720⁄SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p⁄ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14⁄10⁄2015, DJe 20⁄11⁄2015) [original sem grifos]

É possível extrair notórias diferenças do contexto fático, pois: (1) o crédito é oriundo de reclamação trabalhista e (2) a própria ação judicial foi proposta anos após o pedido de recuperação judicial. Por tais razões, o colegiado chegou a conclusão de que “o crédito constituído e ora executado é posterior ao deferimento do benefício recuperacional”.

Nesse contexto, transcreve-se o pertinente trecho da fundamentação apresentada pelo em. Ministro relator para o acórdão:

Assim, a solução inicialmente apresentada pelo ilustre relator quanto ao prosseguimento do processo executivo, é a que melhor se amolda à exegese do comando normativo contido no art. 49, da Lei n.º 11.101⁄2006, porquanto, inobstante a recuperação judicial encontrar legalmente abrigo sob o manto do princípio geral da proteção e da preservação da empresa, o Poder Judiciário não pode consagrá-la como fonte de descumprimento de obrigações assumidas, razão pela qual, em respeito e observância ao disposto no art. 49 da Lei n.º 11.101⁄2005, apenas os créditos existentes, ou seja, efetivamente constituídos, até a data do pedido estão sujeitos à recuperação judicial. […]
A delimitação da moldura fática se faz necessária para se adotar o entendimento acima descrito.
Verifica-se, das informações prestadas pelos juízos suscitados, que o pedido de recuperação judicial, após ter sido deferido, foi homologado em 11 de junho de 2010 (fl. 77, e-STJ) pelo Juízo de Direito da 8.ª Vara Cível da Comarca de São José do Rio Preto, no Estado de São Paulo. A reclamação trabalhista, objeto deste incidente, por sua vez, foi ajuizada perante o Juízo da Vara do Trabalho de Olímpia⁄SP em 02 de agosto de 2012, cuja sentença condenatória transitou em julgado em 10 de abril de 2013, dando origem a presente execução.
Tem-se, portanto, que o crédito constituído e ora executado é posterior ao deferimento do benefício recuperacional. [original sem grifos]

6. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para determinar a inclusão do crédito discutido nos autos no plano de recuperação judicial.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2014⁄0081270-0
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.447.918 ⁄ SP

Números Origem: 0018962 00538282820118260000 18962 5830020021124992

PAUTA: 07⁄04⁄2016 JULGADO: 07⁄04⁄2016

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. HUMBERTO JACQUES DE MEDEIROS

Secretária
Dra. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL
ADVOGADOS : CLÁUDIA REGINA SOARES E OUTRO(S)
LUCIMARA FERRO MELHADO E OUTRO(S)
RECORRIDO : WILLIAM ROBERTO DE CAMPOS
ADVOGADO : ANA CAROLINA DE MORAIS GUERRA E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO CIVIL – Responsabilidade Civil – Indenização por Dano Moral

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dra. LUCIMARA FERRO MELHADO, pela parte RECORRENTE: GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente) e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0)

VOTO

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhores Ministros, cumprimento a bela sustentação oral feita pela advogada, o voto tão esclarecedor do Senhor Ministro Luis Felipe Salomão.
Com relação ao conflito de competência citado, penso que nele não se estabeleceu propriamente um precedente em termos de matéria substancial, de direito material, porque, no conflito, só estávamos a decidir o juízo competente, e me recordo que nem dava para saber, das peças daquele conflito, se o direito a verbas trabalhistas tinha sido constituído antes ou depois do pedido de recuperação. Sabia-se que o pedido de recuperação havia sido formulado em uma determinada data, e que a reclamação havia sido proposta anos depois, mas não se sabia se o reclamante postulava verbas salariais pertinentes a dias trabalhados no período anterior à recuperação ou se era um empregado que haveria sido admitido posteriormente ao pedido de recuperação.
No meu entender, o que significa a lei com “crédito existente” não é a data da sentença que estabeleceu o crédito e nem a data do ajuizamento da ação. Penso que direito trabalhista é constituído com o trabalho, ele é apenas declarado com a sentença.
No referido conflito não se decidiu sobre preferência de créditos; e eventualmente, pode haver um trabalhador que continue trabalhando para a empresa em recuperação, e aí os salários anteriores ao pedido de recuperação, a meu ver, têm que integrar o plano, mas os salários pertinentes ao trabalho feito após o pedido de recuperação, esses, sim, estariam fora do pedido de recuperação. Mas nada disso era possível julgar naquele conflito.
E indo ao encontro da observação do Ministro Raul Araújo, entendo que, realmente, o que nasce com o cometimento do ato ilícito é a obrigação de indenizar, à qual corresponde o direito da vítima à indenização. Eventual sentença condenatória vai declarar esse direito, o qual pode ser controvertido; as partes podem discutir quem foi o causador do acidente, por exemplo, a sentença procederá ao acertamento desses fatos, para que se defina quem foi o culpado, e se há realmente essa obrigação e, depois, o valor dessa obrigação, na fase de conhecimento e na fase de liquidação. Essa sentença terá uma carga declaratória e uma carga condenatória, e não uma carga constitutiva, tanto que se for entendido que houve o ato ilícito e que ele foi praticado pelo réu, a condenação deve restaurar o prejuízo, com todas as suas consequências, retroativamente à data do ilícito, termo inicial da mora.
Entendo que a Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial e de Falência, em seu art. 49, quando fala que “Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos”, e, depois, quando a doutrina fala em créditos que se constituírem antes ou depois, créditos existentes na data do pedido de recuperação, quer se reportar às obrigações e aos fatos geradores das obrigações, e não créditos já declarados por sentença na data da recuperação.
Com efeito, a data da prolação da sentença, e, mais ainda, do trânsito em julgado, depende de circunstâncias totalmente fora das possibilidades de intervenção das partes, como o tempo de tramitação do processo, que não anda necessariamente com a celeridade desejada.
Portanto, cumprimentando o voto do Ministro Relator, a ele adiro no sentido de dar provimento ao recurso especial.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0)

VOTO-VOGAL

O SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Cumprimento a ilustre advogada, Doutora Lucimara Ferro Melhado, pela sustentação oral que nos apresentou, o eminente representante do Ministério Público por seu judicioso Parecer e o eminente Ministro Relator, que nos traz, como sempre, um excelente voto.
A respeito da preocupação a que se referiu o ilustre representante do Ministério Público, creio que não podemos nos preocupar tanto com o aspecto mencionado, pois é certo que os créditos constituídos após o pedido de recuperação não estarão submetidos à recuperação, com o que não haverá aquela preocupante, digamos, imunidade ou isenção legal em relação a ofensas que sejam traduzidas por via de abusos da liberdade de informação, da liberdade de imprensa. Então, pelo que estamos dizendo aqui, apenas os créditos oriundos de obrigações anteriores é que ficarão submetidos ao plano de recuperação.
Agora, relativamente à conclusão a que chega o eminente Ministro Relator, dela divirjo apenas em parte, não no resultado, o resultado a que chego é o mesmo, porque entendo que devemos reconhecer que o crédito constituído após o pedido de recuperação judicial, porém, decorrente de obrigação nascida anteriormente ao pedido, fica submetido ao plano de recuperação. Não me parece que possamos afirmar que existisse o crédito desde a data da ofensa, desde a data do dano moral causado ao ofendido. Não existia propriamente um crédito aí, mas existia já uma obrigação de reparar. Então, essa obrigação é antecedente ao pedido da recuperação judicial. Embora o crédito seja constituído posteriormente ao pedido de recuperação judicial, como ele é decorrente de uma obrigação anterior ao pedido de recuperação, chego ao mesmo resultado de que ele está submetido ao plano de recuperação judicial, como entende também o eminente Ministro Relator.
Faço apenas esse ajuste em meu voto. Não sei se Sua Excelência concorda, mas penso que podemos ter essa conclusão, talvez, um pouco mais ousada, de dizer que, mesmo sendo um crédito constituído posteriormente ao pedido de recuperação, como ele é decorrente de uma obrigação anterior, fica submetido ao plano de recuperação judicial.
Não podemos dizer que nasce um crédito com a violação do direito de uma pessoa. Nasce uma obrigação de reparar aquela violação. O crédito será apurado posteriormente.
Com esses comentários, acompanho o voto eminente Relator no sentido de dar provimento ao recurso especial.

 

Data: 09/06/2016

Fonte: www.leidefalencias.com.br